STJ: filhos de herdeira que faleceu junto com segurado devem receber a parte que lhe caberia
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ afastou a possibilidade de pagamento da indenização securitária apenas à irmã viva do titular do seguro ao decidir que os filhos da outra irmã, que morreu junto com o irmão responsável por contratar o benefício, devem receber a parte do seguro de vida que lhe caberia. Para o Tribunal, o fato de ter havido morte presumivelmente simultânea – a chamada comoriência – não impede o direito aos filhos.
De acordo com o processo, o titular do seguro de vida – que não tinha cônjuge, pais vivos ou filhos – faleceu em um acidente de trânsito junto com a sua irmã, que tinha dois filhos. Como o contrato de seguro não indicava beneficiários, a seguradora pagou a indenização integralmente para a única irmã viva do segurado, sua herdeira colateral.
Diante disso, os filhos menores da irmã falecida ingressaram com ação e alegaram que a indenização deveria ser dividida entre eles e a tia. O pedido foi acolhido em primeiro grau, mas a sentença foi reformada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP, segundo o qual não haveria transmissão de direitos entre parentes que morreram na mesma ocasião.
Segundo o colegiado, o direito de representação se destina a proteger o interesse dos filhos que perderam precocemente seus pais.
“A questão ganha ainda mais relevo quando os que pleiteiam o direito de representação são crianças e adolescentes – inseridos na condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, conforme reconhecido pelo artigo 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, e cuja proteção deve ser garantida com absoluta prioridade pela família, pela sociedade e pelo Estado (artigo 227 da Constituição)”, afirmou a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso.
Legítima
Ela destacou, nos termos do artigo 1.829 do Código Civil, que a sucessão legítima segue a seguinte ordem: 1º) descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se o cônjuge for casado com o falecido em comunhão universal, ou com separação obrigatória de bens; ou se, no regime da comunhão parcial, o falecido não deixar bens particulares; 2º) ascendentes, em concorrência com o cônjuge; 3º) cônjuge sobrevivente, e; 4º) colaterais.
Entretanto, Andrighi lembrou que há uma hipótese excepcional de sucessão por direito de representação, na qual a lei chama determinados parentes do herdeiro falecido para receberem todos os direitos que ele receberia se estivesse vivo.
“Pelo direito de representação, herdeiros de grau mais próximo concorrerão com os de grau mais distante, que receberão a herança na qualidade de representantes daquele que, se vivo fosse, seria herdeiro daquele grau mais próximo”, completou.
Segundo Nancy Andrighi, embora não seja a hipótese mais comum, é possível que o direito de representação ocorra no caso das mortes simultâneas do representado e do autor da herança. A ministra enfatizou que a legislação brasileira não estabelece que a situação afastaria o direito de representação.
“O filho que perdeu prematuramente seu pai antes do seu avô, por exemplo, encontra-se em uma situação em tudo similar à do filho que perdeu o pai e o avô em um mesmo acidente de trânsito”, disse ela.
No caso dos autos, a ministra comentou que, se a mãe tivesse morrido segundos antes do segurado, não haveria dúvidas quanto ao direito de representação dos filhos, ao passo que, caso a morte do segurado ocorresse antes, a mãe dos menores receberia – em concorrência com a outra irmã – parte do valor da indenização, a qual seria repassada a título de herança para os recorrentes.
“Ao se presumir a morte simultânea, não se pode conferir uma interpretação dos artigos 1.851 ao 1.854 do Código Civil apta a gerar a injusta, situação em que os recorrentes não teriam direito a nada e que caberia à irmã viva o valor integral do seguro”, concluiu a ministra ao restabelecer a sentença.
REsp 2.095.584
Fonte: IBDFAM